A guarda compartilhada requer aptidão e interesse de ambos os pais

Considerações Preliminares

Uma questão que precisa ser decidida concomitantemente ao divórcio ou à dissolução da união estável, quando se tem filhos menores, diz respeito à guarda destes, até para que não haja um desajuste psicológico ainda maior, até porque a ruptura por si só já causa um grande desgaste emocional.

Sabemos que é praticamente impossível evitar o sofrimento dos filhos, mas é possível minimizar se as partes estiverem alinhadas nesse sentido, o que dificilmente acontece, sobretudo se o rompimento se deu por conta de alguma traição, tornando o divórcio ou dissolução da união estável sempre muito desgastante e barulhento.

Como eu sempre digo, as partes não devem ser acorrentadas ao matrimônio se os motivos pelos quais se uniram não mais existem, visto que o amor, o respeito e a parceria devem caminhar juntos, caso contrário, a relação vai definhando dia após dia e a falência da sociedade conjugal se torna inevitável.

Historicamente, a guarda dos filhos – após a dissolução da sociedade conjugal – era atribuída automaticamente à mãe, sem qualquer discussão sobre o tema, até pelo fato de que as mulheres não tinham uma atividade profissional e se dedicavam exclusivamente ao marido e aos filhos.

Ocorre que com a emancipação das mulheres – mesmo que de forma paulatina – e a luta por lugares de destaque no mundo corporativo, as coisas foram mudando e o Direito de Família precisou se adaptar nesse sentido, aliás, o ordenamento jurídico precisa constantemente de adaptação, embora demore bastante para acompanhar as evoluções sociais.

Num cenário de mulheres cada vez mais atuantes, na busca incessante de materializar o princípio da igualdade entre homens e mulheres, assim como a necessidade de equalizar a responsabilidade dos genitores e o melhor interesse da criança e do adolescente, o instituto da guarda teve de ser revisto e necessariamente modificado.

Guarda Compartilhada

Lei 11.698/2008

A guarda unilateral – que prevaleceu por um longo período – como todos sabem, é aquela atribuída a apenas um dos genitores, restando ao outro genitor, numa análise prática e sucinta, a possibilidade de visitas, além do pagamento de pensão alimentícia.

Como a guarda unilateral sempre existiu e já é de conhecimento púbico, o nosso foco será a guarda compartilhada, que surgiu com bastante força na Inglaterra, especificamente na década de sessenta e acabou – tendo em vista resultados extremamente positivos -, espalhando-se logo após entre a Europa e os Estados Unidos.

O Brasil demorou para aderir ao instituto da guarda compartilhada, mas com o advento da Lei 11.698/2008, a guarda unilateral – também conhecida como única ou exclusiva – cedeu espaço para uma nova possiblidade: a guarda compartilhada.

O conceito de guarda compartilhada está estampado no art. 1.583, §§ 1º, 2º e 3º, do Código Civil e será comentado, a seguir:

Art. 1.583.  A guarda será unilateral ou compartilhada.

§ 1 Compreende-se por guarda unilateral a atribuída a um só dos genitores ou a alguém que o substitua (art. 1.584, § 5 ) e, por guarda compartilhada a responsabilização conjunta e o exercício de direitos e deveres do pai e da mãe que não vivam sob o mesmo teto, concernentes ao poder familiar dos filhos comuns.

Conforme já esclarecido, a guarda unilateral é aquela atribuída a apenas um dos genitores e a guarda compartilhada, aquela cuja responsabilidade se dá de maneira conjunta entre pai e mãe, buscando-se o equilíbrio familiar e o melhor interesse dos filhos, sempre.

Na guarda compartilhada, ambos os genitores exercem seus direitos e deveres – quanto aos filhos menores – de modo equivalente, e qualquer tentativa de diminuir a autoridade do outro pode esbarrar na alienação parental, assunto que já foi devidamente tratado por aqui (http://almeidaadv.adv.br/parentesco/alienacao-parental/).

§ 2 Na guarda compartilhada, o tempo de convívio com os filhos deve ser dividido de forma equilibrada com a mãe e com o pai, sempre tendo em vista as condições fáticas e os interesses dos filhos.

O § 2º foi incluído pela Lei 13.058/2014, que cuidou de enfatizar a importância da guarda compartilhada, estabelecendo mais equilíbrio entre os envolvidos e permitindo que os filhos tenham a possibilidade de conviver com ambos os pais, em períodos mais justos e melhor divididos.

Vale esclarecer que esse convívio equilibrado levará em conta o melhor interesse dos filhos, devendo o juiz de direito analisar caso a caso e distribuir a justiça de maneira personalizada, tendo em vista que cada família tem uma característica distinta, particular e o magistrado deve estar atento a esses detalhes de ordem familiar.

§ 3º Na guarda compartilhada, a cidade considerada base de moradia dos filhos será aquela que melhor atender aos interesses dos filhos.

O § 3º, também foi inserido pela Lei 13.058/2014, e tratou de ajustar uma questão deveras importante, a cidade base de moradia dos filhos, sendo a que melhor atender aos interesses dos filhos, pois embora a responsabilidade no tocante à criação e educação seja conjunta nesses casos, o juiz terá de fixar a base de moradia dos infantes, que por sua vez precisam de rotina, estabilidade e nada melhor do que uma base fixa de moradia.  

Vale ressaltar que quando a guarda compartilhada é bem aplicada e administrada com responsabilidade por ambos os genitores, os filhos são os maiores favorecidos e a saúde mental destes agradece, visto que ninguém merece uma vida turbulenta, bagunçada e cheia de desavenças.

Guarda Compartilhada e a Necessidade de Aptidão e Interesse

O art. 1.584, § 2º, do Código Civil deixa claro que é preciso aptidão – no que se refere à criação e educação dos filhos – e ambos devem querer a aplicação do instituto da guarda compartilhada, caso contrário, será atribuída a guarda unilateral.

Art. 1.584.  (…)

§ 2 Quando não houver acordo entre a mãe e o pai quanto à guarda do filho, encontrando-se ambos os genitores aptos a exercer o poder familiar, será aplicada a guarda compartilhada, salvo se um dos genitores declarar ao magistrado que não deseja a guarda do menor.”

Não havendo consenso entre as partes em relação à guarda dos filhos, mas restando claro que ambos têm aptidão ao exercício do poder familiar (criação e educação), será aplicada a guarda compartilhada.

Todavia, se o pai ou a mãe declarar ao juiz que não tem interesse na aplicação da guarda compartilhada, a guarda será atribuída ao outro genitor de forma única e exclusiva, estabelecendo ao que não deseja a guarda compartilhada períodos específicos de visitação.

Exemplos Singelos de Inaptidão

Por outro lado, se o juiz verificar que uma das partes não tem a mínima condição de ser guardião dos filhos (leia-se falta de aptidão), tendo em vista seu histórico de dependência química, agressividade contumaz e eventuais situações que possam comprometer a saúde (física, mental e emocional) e a segurança dos filhos, não será aplicada a guarda compartilhada, mesmo que a parte declare interesse no referido instituto.

Portanto, muito embora a guarda compartilhada seja a regra geral, além do interesse em participar, efetivamente, da criação e educação dos filhos (guarda compartilhada), tomando decisões importantes em conjunto com o outro genitor, a parte precisa ter aptidão ao exercício do poder familiar.

Consulte, sempre, um advogado ou advogada de sua confiança.

Edney de Almeida Silva

Consultor jurídico em São Paulo

Especialista em Direito de Família e Sucessões

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