Ao contrário do que muitos acreditam, o reconhecimento do casamento homoafetivo como entidade familiar não se deu em virtude de lei, mas em decorrência de decisão judicial, tida como histórica diante da relevância da matéria.
RECONHECIMENTO DA UNIÃO ESTÁVEL ENTRE PESSOAS DO MESMO SEXO – STF
Antes de falar sobre a Resolução n. 175, do CNJ, faz-se necessário uma contextualização a fim de facilitar o entendimento, pois a união homoafetiva e o o casamento homoafetivo são possíveis por conta de decisões judiciais e não em virtude de lei, embora seja essa a forma mais apropriada para tratar da referida matéria.
Nos termos da lei, a união estável e o casamento são entidades familiares entre homens e mulheres, mas o STF (04/05/2011), ao julgar a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) n. 4277/DF e a Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) n. 132/RJ, reconheceu como entidade familiar a união entre pessoas do mesmo sexo.
O relator, ministro Ayres Britto, votou no sentido de dar interpretação conforme a Constituição Federal a fim de excluir qualquer significado do artigo 1.723, do Código Civil, que impeça o reconhecimento da união entre pessoas do mesmo sexo como entidade familiar.
COM A DECISÃO DO STF
LEIA-SE “UNIÃO ENTRE DUAS PESSOAS”
Os demais ministros acompanharam o voto do relator e a decisão, com efeito vinculante, teve de ser observada por toda a sociedade, sendo que na prática, o art. 1.723, do Código Civil, muito embora não tenha sido alterado, deve ser lido da seguinte forma: união estável entre duas pessoas e não mais união estável entre homem e mulher.
DO CASAMENTO ENTRE PESSOAS DO MESMO SEXO
POSSIBLIDADE – STJ
Diante da histórica decisão proferida pelos Ministros do STF, reconhecendo a união homoafetiva como entidade familiar, restou analisar a possibilidade do casamento entre pessoas do mesmo sexo, questão que foi devidamente enfrentada nos autos do Recurso Especial n. 1.183.378 pela Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça, poucos meses depois de o STF ter reconhecido a união homoafetiva como entidade familiar.
A Quarta Turma do STJ, debruçando-se sobre um tema bastante peculiar e diante de posicionamentos contrários – por maioria de votos – deu provimento ao recurso a fim de possibilitar o casamento entre duas mulheres (25/10/2011), que numa longa e desgastante batalha judicial buscavam a habilitação para o casamento e tiveram seus pleitos negados em primeira e segunda instâncias, sob o fundamento de que a matéria tinha de passar pelo crivo do Poder Legislativo.
Tendo em vista que o Código Civil não veda expressamente o casamento entre pessoas do mesmo sexo, o ministro-relator Luis Felipe Salomão ponderou que considerar uma vedação implícita ao casamento homoafetivo implicaria numa grande afronta aos princípios da dignidade da pessoa humana, da não discriminação, da igualdade, do pluralismo e do livre planejamento familiar.
Mesmo com decisões judiciais, proferidas pelos Tribunais Superiores, reconhecendo tanto a união homoafetiva quanto o casamento homoafetivo como entidades familiares, muitos Cartórios entendiam que a legislação acerca do tema permanecia inalterada, razão pela qual não seria possível o casamento entre pessoas do mesmo sexo.
RESOLUÇÃO N. 175 DO CNJ
Tendo em vista o impasse e considerando que, de fato, tratava-se de uma situação que necessariamente precisaria ser decidida de forma mais veemente, o Conselho Nacional de Justiça baixou a Resolução n. 175 para eliminar – de uma vez por todas – dúvidas sobre a possibilidade do casamento entre pessoas do mesmo sexo, determinando sanções aos responsáveis pela recusa no tocante ao casamento entre pessoas do mesmo sexo.
Senão, vejamos.
Art. 1º É vedada às autoridades competentes a recusa de habilitação, celebração de casamento civil ou de conversão de união estável em casamento entre pessoas de mesmo sexo.
Art. 2º A recusa prevista no artigo 1º implicará a imediata comunicação ao respectivo juiz corregedor para as providências cabíveis.
Art. 3º Esta resolução entra em vigor na data de sua publicação.
O Conselho Nacional de Justiça, de maneira bastante objetiva, colocou um fim nesse imbróglio (04/05/2013) e a partir desse momento, pessoas do mesmo sexo conseguiram constituir suas famílias.
ATIVISMO JUDICIAL
POSSIBILIDADE DIANTE DA OMISSÃO INJUSTIFICADA DO CONGRESSO NACIONAL
Como já ressaltei nos informativos anteriores sobre o reconhecimento da união homoafetiva e casamento homoafetivo como entidades familiares, não considero o meio mais adequado, nem o ambiente mais apropriado em respeito à Tripartição dos Poderes, tendo em vista que essa matéria tinha de passar pelo crivo do Congresso Nacional, em algumas sessões de debates etc., mas sabemos das dificuldades para a sua aprovação e a possibilidade de nunca votarem, sob a justificativa infundada de que outras matérias estariam na fila de preferência.
Embora discorde dos meios, o ativismo judicial foi muito bem aplicado pelos Tribunais Superiores, até pelo fato de que não há qualquer vedação constitucional ou infraconstitucional nesse sentido.
Edney de Almeida Silva
Consultor jurídico em São Paulo
Especialista em Direito de Família e Sucessões